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O que sabemos sobre a Covaxin, a vacina indiana comprada pelo Brasil

Análise preliminar sugere que esse imunizante contra o coronavírus é 81% eficaz. Especialistas alertam para falta de dados, mas também destacam vantagens

Por Chloé Pinheiro
Atualizado em 25 mar 2021, 15h35 - Publicado em 5 mar 2021, 17h47

O Ministério da Saúde anunciou recentemente a compra de 20 milhões de doses da Covaxin (BBV152), uma vacina contra a Covid-19 produzida pelo laboratório indiano Bharat Biotech. O produto ainda não foi autorizado pela Anvisa e segue em testes.

Segundo o fabricante, a Covaxin demonstrou 81% em análise preliminar do seu estudo fase 3. A etapa, a última para comprovar eficácia e segurança, compara a dose real com um placebo em dezenas de milhares de pessoas. Mais de 25 mil indianos participam da investigação, que começou em novembro.

Até o momento, 43 deles contraíram Covid-19 – 36 no grupo placebo e 7 entre os vacinados. Essa é a chamada análise interina, ou seja, ainda não é o suficiente para atestar a eficácia. Ela serve mais como um termômetro para os pesquisadores. A porcentagem de eficácia será calculada com mais confiança quando 130 voluntários pegarem a doença, de acordo com o protocolo do experimento.

“De qualquer jeito, a diferença nessa análise interina entre os grupos  é significativa. Isso indica que a vacina pode ser mesmo eficaz, mas é preciso atingir o número previsto no protocolo para ter certeza”, aponta a epidemiologista Denise Garrett, vice-presidente do Sabin Institute, nos Estados Unidos.

Além disso, o anúncio dos resultados foi feito via comunicado de imprensa. “Não temos os dados na íntegra para avaliá-los, e isso é importante para saber a qualidade do trabalho”, comenta Mellanie Fontes-Dutra, biomédica fundadora da Rede Análise Covid-19.

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Como funciona a Covaxin

Ela usa versões inativadas do Sars-CoV-2. Essa é uma tecnologia tradicional e semelhante à utilizada pela Coronavac, do Instituto Butantan. Primeiro, é preciso isolar o vírus, depois replicá-lo em células e, por fim, usar uma substância química ou outro tratamento para inativá-lo. Ao aplicar o composto no paciente, espera-se que seu sistema imune gere anticorpos contra o vírus.

A simplicidade e o largo conhecimento sobre essa tecnologia é uma das vantagens. “Muitos laboratórios são capacitados para produzir a vacina, e a metodologia não é cara”, explica o infectologista Renato Kfouri, da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).

Além disso, ela pode ser conservada em temperatura de geladeira, entre 2 a 8ºC. O conteúdo do frasco permanece válido para uso até 28 dias depois da abertura, desde que bem armazenado.

O que temos de estudos sobre ela

Antes de ser aprovada, uma vacina deve passar pelos ensaios pré-clínicos (em células isoladas e animais), depois por três etapas de testes em humanos. Os estudos de fase 1 foram publicados no renomado periódico The Lancet, ponto positivo para o imunizante.

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A fase 2, que continua investigando a segurança e quantifica a resposta imune, está disponível no site medRvix, que reúne trabalhos ainda não revisados por outros pesquisadores. Já fase 3 sequer disponibilizada ao público e aos cientistas, como dissemos.

Questionada sobre a publicação dos dados, a Precisa Medicamentos, parceira da Barat Biotech no Brasil, avisou que não irá se manifestar por ora.

Quando a Covaxin chega ao Brasil?

Segundo o Ministério da Saúde, as primeiras 8 milhões de doses começam a desembarcar em março. “Em dois lotes de 4 milhões a serem entregues entre 20 e 30 dias depois da assinatura do contrato”, diz o texto. O documento foi assinado em 25 de fevereiro.

Em abril, seriam mais 8 milhões e, em maio, outras 4 milhões de unidades. Para que a vacina seja distribuída a população, contudo, é preciso obter a aprovação da Anvisa para uso emergencial ou definitivo.

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A Precisa também não se manifestou sobre a formalização do pedido, mas técnicos da Anvisa estão vistoriando a fábrica na Índia. Reuniões entre as partes já aconteceram. A parceira brasileira afirma ter entrado com o pedido para um estudo complementar de fase 3 no Brasil, que facilitaria a obtenção de dados sobre sua eficácia.

Uma vez que o pedido é feito, a Anvisa tem até dez dias para responder sobre o uso emergencial, e 60 se houver uma solicitação de registro definitivo. Mas é provável que ainda tenhamos que esperar para usar a Covaxin. “Como o estudo começou no final de novembro, é difícil termos informações suficientes para uma aprovação”, destaca Kfouri.

Compra atabalhoada

Para os especialistas, é certo que contar com mais 20 milhões de doses de uma vacina ajuda no crítico cenário brasileiro. O problema é que a aposta foi feita em cima de uma fórmula ainda não avaliada por cientistas e pelas autoridades ao redor do mundo. Enquanto isso, outros imunizantes que já superaram esses testes foram deixados em segundo plano pelo governo federal.

Só mais recentemente (e depois de fechar o acordo com a Barat Biotech), o Ministério da Saúde anunciou que pretende adquirir 100 milhões de doses da vacina da Pfizer, que começariam a ser entregues no segundo trimestre, e 38 milhões da Janssen, que chegariam a partir de julho. “Isso merece ser ressaltado. O Brasil saiu para comprar uma vacina que não terminou sua fase 3, sendo que temos outras que finalizaram essa etapa, com testes inclusive aqui”, aponta Denise.

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“É uma aposta promissora, mas que implica riscos. Essa vacina não foi avaliada por agências regulatórias fora da Índia”, complementa Kfouri.

Na Índia, a Covaxin está no centro de uma polêmica justamente por ter sido liberada em caráter de urgência antes da conclusão dos estudos de fase 3. Para os especialistas ouvidos nesta reportagem, é mais vantajoso investir em produtos aprovados e que estão sendo distribuídos por outros países. Isso inclusive simplifica a análise da Anvisa, facilitando o acesso à doses.

Funcionaria melhor contra variantes?

Vacinas de vírus inativado, em teoria, podem funcionar melhor contra mutações. “Elas estimulam o sistema imunológico com várias partes do vírus, e não apenas com uma das proteínas da superfície, como ocorre com algumas outras tecnologias”, aponta Kfouri.

Explica-se: parte dos imunizantes disponíveis hoje (como o da Pfizer e o da Astra Zeneca) focam na proteína S, a spike, do agente infeccioso. Se esse trecho do vírus sofre mutações, é possível que as doses percam parte da eficácia, embora isso precise ser estudado. O produto da Barat Biotech, por outro lado, apresenta o vírus todo (inativado) ao sistema imune. Com isso, a chance de reconhecer o Sars-CoV-2 mesmo se ele sofrer alterações relevantes seria maior.

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A Covaxin já mostrou, em pesquisa não revisada por pares, que é capaz de gerar anticorpos neutralizantes contra a variante inglesa, a B.1.1.7. “Mas isso é diferente de afirmar que ela é eficaz, o que depende de mais estudos”, explica Mellanie.

Há outro ponto a se considerar. Temos dois tipos de reação a um vírus, a de anticorpos e a celular, que ocorre dentro das próprias células infectadas. Essa segunda parece ser importante na defesa ao Sars-CoV-2 e suas variantes. “Vacinas dessa categoria não costumam despertar tanto a imunidade celular”, lamenta Kfouri.

Mas pode ser que a Covaxin mude essa fama. “Seu adjuvante [ingrediente adicionado à fórmula que ajuda a estimular o sistema imunológico] é  conhecido por potencializar esse tipo de resposta”, destaca Denise.

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